sexta-feira, 13 de março de 2009

O Wrestler




Título Original: The Wrestler
Realização: Darren Aronofsky
Ano: 2008

De tempos a tempos surge no cinema aquele tipo de personagens enormes, maiores que o mundo, cuja aura ultrapassa a do próprio filme onde entram, capazes de invadir o imaginário popular e resistir ao teste do tempo. Randy "The Ram" Robinson é, sem dúvida, um desses casos raros. E se é verdade que houve um conjunto de factores que contribuíram para que isso acontecesse, um é absolutamente essencial: Mickey Rourke. Não havia melhor escolha para liderar o elenco e Aronofsky, ao insistir na sua contratação, mostrou que sabe apostar no cavalo certo - tendo em conta a presença física e aspecto de Mickey Rourke, a palavra "cavalo" não anda assim tão longe de ter sentido literal.

As semelhanças entre Mickey Rourke e a personagem que interpreta são evidentes, o que dá ao filme um aspecto tão realista que a certa altura nos faz questionar se estamos a acompanhar a queda no mundo da decadência de "The Ram" ou dele próprio, se se trata de uma ficção ou de um documentário biográfico. Os mais jovens poderão já nem se lembrar, mas nos seus tempos áureos, nos anos 80, Mickey Rourke foi uma das maiores promessas de Hollywood, um símbolo sexual capaz de arrebatar o coração de qualquer mulher. Um vida feita de excessos, o seu conhecido feitio difícil e uma incursão no boxe profissional fizeram com que caísse no esquecimento e, mais do isso, com que se transformasse num destroço, seguindo um arrepiante caminho para a autodestruição. São as voltas que a vida dá e não há nada a fazer quanto a isso.

Mas de volta ao filme, Randy "The Ram" Robinson é uma lenda do wrestling que, vinte anos após o auge da sua carreira, se limita a encher o corpo de esteroídes e a participar em insignificantes e violentos combates em terrinhas perdidas no mapa. Caído em desgraça e isolado do mundo, vive numa rolloute e trabalha num pequeno supermercado, onde o dinheiro que ganha nem chega para pagar a renda a tempo e horas. Estão a começar a encontrar as tais semelhanças? Completamente parado nos 80´s, "The Ram" não se tenta adaptar aos novos tempos. Continua a ouvir a mesma música hard rock, a jogar na mesma consola Nintendo de que já nem os fabricantes se lembram e a estar rodeado dos seus próprios bonecos de acção da época. Como "The Ram" diz a meio do filme, "The '90s sucked".

É apenas no carinho do público e dos companheiros no mundo do wrestling que consegue encontrar algo que faça sentido na sua vida. Por esse motivo continua a insistir em subir ao ringue, quando o corpo já dá sérios sinais de não aguentar mais: para lutar contra o esquecimento a que foi votado, para fazer aquilo que mais ama. E torna-se comovente assistir ao seu esforço inglório, e até deprimente, para regressar aos velhos tempos, nem que por uns meros minutos, mesmo pondo em risco a sua vida.

Entretanto também passeiam pelo filme Marisa Tomei, a stripper Cassidy por quem "The Ram" se apaixona, e Evan Rachel Wood, a filha com quem "The Ram" tenta restabelecer uma relação, após longos anos sem contacto. Nada que interesse muito, até porque ambas fazem mais papel de corpo presente do que outra coisa qualquer. Fica especialmente na retina que Marisa Tomei continua em grande forma e com tudo no sítio, mas isso para o caso não é importante. Temos então o lutador nostálgico dos velhos tempos, a tentar formar laços com uma stripper e com a filha que negligenciou durante anos. Estão com a sensação de que já viram isto antes? Sim e não. É verdade que o filme salta de cliché em cliché, mas podem estar descansados, pois Aronofsky e Mickey Rourke são incapazes de deixá-lo cair na banalidade.

"The Wrestler" é uma mistura entre "Rocky Balboa" e "Touro Enraivecido", mas não é por isso que se deixa limitar, conseguindo encontrar o seu próprio espaço e sentido. "The Ram" é uma personagem única e excelentemente interpretada, o que faz toda a diferença. O seu discurso final ao público que o acompanha, dramático e tocante, é a prova disso mesmo e o clímax perfeito para a forma como o filme se desenrolou. Duvído que "The Wrestler" seja o grande comeback de Mickey Rourke - já vai tarde para isso -, mas uma forma de também ele ir, honradamente e sem arrependimentos, dizendo adeus aos grandes palcos. Tal e qual a sua personagem.

Quanto a Aronofsky, tem aqui o seu mais convencional trabalho. Filmado em estilo de documentário, segue as personagens de um lado para o outro, apanhando por diversas vezes planos das suas costas. Depois de Requiem For a Dream ou The Fountain, que viviam sobretudo de uma realização e edição ágeis e alucinantes, Aronofsky virou completamente a agulha. Se for com estes resultados, pode fazê-lo mais vezes que ninguém se importa.

Classificação: 8/10

Sem comentários: