sábado, 12 de julho de 2008

The Savages



Título original: The Savages
Realização: Tamara Jenkins
Ano: 2007

Não é preciso inventar nada: se na mesma equipa contamos com Kaká e Cristiano Ronaldo, é pô-los a jogar e a vitoria é certa. Em The Savages acontece o mesmo: com Laura Linney e Philip Seymour Hoffman nos papéis principais, o resultado só não é brilhante se o resto da equipa se esforçar muito para que isso não aconteça. Realizado por Tamara Jenkins - primeira longa-metragem depois de um período de paragem de quase dez anos -, é um retrato cru e realista sobre a velhice, a decadência e as marcas deixadas por uma infância infeliz. Com um toque de comédia trágico que custa a passar na garganta - como há muito não me lembrava - a história é sempre intensa e mantêm-se coerente, mesmo nos momentos em que poderia balançar para o facilitismo. Tamara Jenkins recebeu como prémio a nomeação para o óscar de melhor argumento original. Embora não tenha estreado nas nossas salas nacionais, The Savages é um filme obrigatório que aconselho a adquirirem, independentemente do meio que escolham para o fazer.

Wendy e Jon Savage (Laura Linney e Philip Seymour Hoffman, respectivamente) são irmãos que passaram por uma infância complicada, com um pai agressivo e uma mãe ausente. Na casa dos 40 anos, os dois ainda guardam marcas profundas desse período que não conseguiram deixar para trás, contando com inúmeros problemas emocionais. Wendy vive em Nova Iorque e mantêm um caso com um homem casado, Jon vive em Buffalo e recusa-se a casar com a sua namorada polaca, que necessita de um visto para não ser obrigada a sair do país.

Sem conhecimento do paradeiro do pai, Lenny Savage (Philip Bosco), e pouco preocupados com o assunto, são surpreendidos por uma chamada de Sun City, informando-os da morte da namorada do pai. Incapaz de cuidar de si próprio, devido a um problema de senilidade, e sem mais ninguém interessado em o fazer, Wendy e Jon são obrigados a unir-se e assumir a responsabilidade, como única família que Lenny possui. Quem teve o azar de passar por uma situação deste tipo sabe bem o que se segue. Jon encontra um lar para Lenny em Buffalo, de modo a estar mais perto deles, e cada um tenta lidar com a situação da maneira que pode e sabe. Wendy não se conforma com o estado em que o pai se encontra, e tenta de todas as formas melhorar a qualidade de vida nos últimos tempos que lhe restam. Jon, mais frio e reservado, está menos disposto a perdoá-lo e vê o seu estado como irreversível. Pela linguagem corporal, compreendemos que quer que tudo passe rápido para regressar à normalidade. Empurrado por Wendy, vê-se relutantemente envolvido em actividades inúteis para tentar uma ligação, ténue que seja, com o pai. Lenny, mesmo demente, continua mal-humorado, mal-educado e irritado, ao mesmo tempo que consegue fazer-nos acreditar que, por muito mau que tenha sido para com os filhos, estes ainda se importam um pouco consigo.

O filme podia cair no sentimentalismo, com muito choro e profundas lições de vida, mas felizmente não contem com isso. Aqui não há vitimas nem culpados. Lenny não se procura redimir de nada do que fez no passado, tanto que tem grandes dificuldades em recordar-se onde se encontra no presente. Wendy e Jon, por muito afectados que a infância os tenha deixado, são responsabilizados pelos falhanços das suas vidas profissionais e afectivas. São os dois aspirantes a dramaturgos e vêem os seus esforços para conseguir uma bolsa de escrita da Guggenheim serem constantemente rejeitados.
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A pouco e pouco, Laura Linney torna-se o centro da narrativa. Embora seja uma actriz fantástica, é pena que Philip Seymour Hoffman tenha sido deixado para segundo plano, porque é um actor um bocado mais que fenomenal e tem, na minha opinião, a personagem mais interessante, misterioso e com mais margem de progressão. Sabe a pouco, e ficamos com a noção de que fosse Jon a assumir o comando, e não Wendy, o filme podia ser um caso bem mais sério. Jenkins concentrou-se mais nos sentimentos das personagens do que na construção de uma narrativa especialmente inspirada. Com o calibre dos actores disponíveis, e com os momentos que nos proporcionam, não se pode dizer que tenha escolhido mal. Isto apesar de às vezes parecer faltar alguma coisa, que nem sabemos dizer bem o quê.
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Se vão à procura de respostas, procurem noutro lado. Não há maneira correcta de lidar com assuntos tão delicados como a morte, a doença e a velhice. E lidar com medos pessoais depende apenas de cada um. Jenkins transmite-nos isso mesmo.
Comovente e duro nas doses certas, tudo nos soa a verdade e vivemos com as personagens a angústia das escolhas que necessitam de fazer e as pequenas vitórias do dia-a-dia. Não é perfeito, mas é um grande prazer.


Classificação: 8/10

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