segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Contas à Vida - 60's Dr. Estranho Amor




Título Original: Dr. Strangelove or: How I Learned to Stop Worrying and Love the Bomb
Realização: Stanley Kubrick
Ano: 1964

Década de 60, a guerra fria atinge o seu auge, o conflito nuclear é uma ameaça séria à sobrevivência e as pessoas vivem em permanente medo e ansiedade. Duas potências confrontam-se num conflito sem fim à vista. O que fazer perante esta situação dramática? Stanley Kubrick tinha a resposta: uma comédia, e provavelmente a mais deliciosa comédia alguma vez feita. É assim que se vêem os génios: pega-se numa situação de iminente catástrofe e põe-se toda a gente a rir. Não é preciso efeitos especiais (poucos havia na época), nem histórias demasiado complexas e nem sequer muitos actores (Peter Sellers desempenha o papel de três personagens). Parece fácil, mas vai-se a ver é até bastante complicado, e provavelmente só Stanley Kubrick para nos trazer esta obra-prima. Quando se sabe...


Mas Stanley Kubrick não faz milagres sozinho. Ter Peter Sellers como protagonista ajuda e não é pouco, e o resto do elenco também não lhe fica a dever nada. O que mais impressiona é que nada é deixado ao acaso, tudo bate certo. Todos os movimentos, falas, expressões roçam a perfeição. A forma como é construída a tensão, o ritmo e a insanidade crescente é isenta de falhas. Apesar de toda uma carreira de fazer inveja, a realizar filmes brilhantes, a reinventar géneros e a influenciar movimentos, Stanley Kubrick conseguiu aqui o seu trabalho mais completo.

Dr. Strangelove não é uma comédia vazia de significado, muito pelo contrário. Embora não deixe nunca de ser hilariante, é um retrato bem sério dos tempos que se viviam e dos riscos de incontáveis perdas humanas, caso a insensatez continuasse a reinar. Uma visão aterradora que Kubrick nos oferece, mais importante que mil teses juntas sobre os efeitos da guerra fria. O sarcasmo e a ironia são uma constante, e o absurdo atinge níveis impensáveis - a conversa telefónica entre o presidente americano e o líder da União Soviética é o melhor exemplo disso.

Jack Ripper (Sterling Hayden) é um general da força aérea que perdeu completamente a noção da realidade. Está convencido que os comunistas estão a planear danificar os "preciosos fluidos corporais" dos americanos e ordena um ataque nuclear aéreo aos soviéticos, sem autorização dos superiores. O presidente (Peter Sellers), por seu lado, organiza uma reunião de emergência no pentágono para solucionar a crise e trazer de volta o avião enviado para lançar a bomba. Mas para que o avião regresse é necessário que Ripper revele o código para o efeito, e este recusa-se a fazê-lo. Para aumentar o problema, o embaixador russo na América revela que se a União Soviética for atingida por uma bomba nuclear, fará activar automaticamente um mecanismo denominado "Doomsday Machine", que tem como objectivo matar toda a vida na Terra.

A solução não está fácil de se encontrar e o tempo começa a escassear. Já em desespero, o presidente manda chamar o Dr. Stangelove (Peter Sellers), um cientista excêntrico ex-nazi que apresenta as propostas mais bizarras que se possa imaginar, e também os momentos mais hilariantes que se possa imaginar. Para mais, tem uma mão biónica que parece ter vontade própria e que volta e meia o tenta estrangular ou faz a saudação nazi. E como se ainda não fosse suficiente, o embaixador russo está mais preocupado em fotografar os segredos contidos na sala do pentágono do que em salvar o mundo da destruição.

A cena final, onde o Major 'King Kong' (Slim Pickens) se monta em cima da bomba em histeria, como se de um cavalo se tratasse, é de antologia. 34 Anos depois, o mundo deu muitas voltas, mas é como se os anos não tivessem passado para este filme. Tão assustador e cómico como no dia de lançamento, é uma verdadeira lição. Garanto-vos, o cinema não fica melhor que isto.

Classificação: 10/10

Sem comentários: