quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Bem-vindo ao Turno da Noite




Título original: Cashback
Realização: Sean Ellis
Ano: 2007

Não fosse a existência das chamadas comédias românticas "light", e o mundo era um lugar bem mais triste. E se se trata de filmes com genuína piada e originalidade, então o meu dia está ganho, independentemente de tudo o resto. É esse o caso de Cashback, estreia na realização de longas-metragens do realizador inglês Sean Ellis, aproveitando e expandindo a ideia de uma curta realizado pelo mesmo em 2004. Actores, história e até pedaços do filme são idênticos. A diferença, em traços largos, é só uma: a curta teve a honra de ser nomeada para os óscares, a longa, sem aspirações para mais, teve a honra de me proporcionar umas quantas gargalhadas de fazer doer a barriga. Sem dúvidas dois grandes feitos.

O filme abre com Ben Willis (Sean Biggerstaff) e a sua ainda namorada, Suzy (Michelle Ryan, aquela jeitosa da série Bionic Woman), a terem uma discussão tão feia que acaba com um candeeiro atirado à cara de Ben. Suzy depressa arranja outro ombro onde se consolar, mas Ben mergulha na piscina da frustração e da depressão. De tanta auto-análise e comiseração, deixou de conseguir dormir e ganhou mais oito horas por dia. Com falta de dinheiro e tempo a mais nas mãos, fez as contas e decidiu o mais lógico: trabalhar durante a noite, no caso num supermercado.

É aí que Ben, para fazer passar as horas, desenvolve a habilidade de parar o tempo (contraditório, não é?), e assim apreciar a beleza de cada momento e de cada segundo. Se ele realmente pára o tempo ou apenas imagina que o faz, o filme não esclarece muito bem , mas também não interessa nada. Na maior parte do tempo somos guiados pela imaginação de Ben, que nos apresenta, entre outras coisas, às belezas infinitas do corpo feminino. Quando congela o tempo, não há mulher que mantenha as roupas no sítio. Vamos indo que volta a colocá-las no sítio antes de fazer o tempo correr novamente.

Não quer isto dizer que se trate de um filme pornográfico . Pelo contrário, é um acto puramente artístico (Ben é pintor) e despretensioso, que entra bem no espírito do filme e serve ainda para entreter a vista. Cashback é uma produção britânica, e esse toque extra de humor cínico e inteligente, inserido no ritmo lento e pastoso do filme, faz toda a diferença. A parte dramática não funciona assim tão bem, mas é o suficiente para nos manter interessados na história e apreciar o restante, aproximando-se, especialmente na parte final, de um "feel-good movie".

E é nas personagens que está grande parte do segredo. O melhor amigo de Ben é um mulherengo, mas com pouca sensibilidade no trato com as mulheres. No supermercado, os seus colegas são, no mínimo, estranhos. Desde um chefe convencido, uma dupla que não pára de pregar partidas e inventar problemas e um empregado novo fanático por Kung-fu, parece não faltar nada. Tantas misturas provocam momentos hilariantes como um jogo de futebol que acabou 26-0, ou a forma como o rapaz do Kung-fu faz as limpezas ao chão. Mas é em Sharon (Emilia Fox), empregada de caixa, que se concentram as atenções de Ben e que está a cura para esquecer Suzy. Os dois vão desenvolvendo uma relação cada vez mais forte e o resto, o resto nem é preciso dizer que já foi visto em muitas salas.

Sean Ellis não se poupou em alguns efeitos visuais de aplaudir, mas nem eram precisos. Os actores estão fantásticos, em especial Ben, perfeito no papel de uma rapaz introvertido e com a cabeça noutro mundo. Cashback é desequilibrado e isso em muito se deve ao facto de excertos da curta serem introduzidos no filme, provocando abanões no tom e estrutura. Nada de grave. Felizmente Sean Ellis não caiu na tentação de fazer um filme intelectual e, aos poucos, foi cedendo aos momentos mais leves e despreocupados. E ao vermos o mundo através de Ben, também nós apreciamos a beleza em redor. Não se trata de uma obra-prima, mas quem gosta de filmes divertidos e agradáveis tem aqui uma excelente surpresa.


Classificação: 7/10

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