quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Cinemas - Estreia da Semana

Charlie Bartlett - Psicanálise para Todos



A vida não está fácil para Charlie Bertlett: constantemente expulso de escolas privadas, está com dificuldades em adaptar-se à realidade de uma escola pública. Desesperado por ser popular, faz as vezes de psiquiatra, começando a dar conselhos e traficar remédios para os colegas. O plano resulta, mas será ele capaz de encontrar o seu próprio caminho e conquistar Susan, a filha do director por quem está apaixonado?

É uma comédia "light" agradável para os últimos dias de verão, especialmente destinada para um público mais jovem. E tem Robert Downey Jr. num dos principais papéis, o que lhe dá sempre uns pontos extra. Em falta de melhor...porque não?

sábado, 29 de agosto de 2009

A Vida Em Palavras

Sobre a Preseverança



Kima: Fightin’ the war on drugs, one brutality case at a time.

Det. Carver: You can't even call this shit a war.

Det. Herc: Why Not?

Det. Carver: Wars end.

The Wire - 1.01 The Target

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Inimigos Públicos



Título Original: Public Enemies
Realização: Michael Mann
Ano: 2009

De Michael Mann, um dos mestres do cinema contemporâneo, vêem sempre boas notícias. Para os fãs de thrillers de acção de qualidade superior ainda mais. Desta feita, fazendo uso da câmara digital de alta definição, que já o havia acompanhado nos seus dois filmes anteriores - "Colateral" e "Miami Vice" -, traz-nos a história de John Dillinger, famoso gangster especialista em assaltos a bancos nos anos 30, numa América a atravessar a fase da grande depressão. Com Johnny Depp e Christian Bale nos principais papéis, todos os ingredientes estavam reunidos para mais uma obra memorável. Mas não foi bem isso que aconteceu. Embora longe de se tratar de um mau filme, "Public Enemies" nunca consegue atingir os níveis de brilhantismo que a qualidade dos nomes constantes na ficha técnica faziam prever.

Como bom filme de gangsters, temos o inevitável duelo entre dois homens carregados de carisma. Christian Bale interpreta o papel de Melvin Purvis, detective realista, meticuloso e sóbrio, encarregue de capturar Dillinger - isto apesar de Bale ser mais famoso em Hollywood pela tendência a ataques de fúria inesperados. E também não falta a trágica história de amor: Marion Cotillard - mais conhecida pelo seu papel como Edith Piaf - é Billie Frenchette, por quem Dillinger se perde de amores e a quem promete nunca abandonar. Promessas já se sabe, leva-as o vento, mas no caso de Dillinger não é bem assim: ele nunca as deixava por cumprir.

John Dillinger era um fora-da-lei, mas nem isso evitou que se transformasse numa figura importante da cultura popular, amado pela sociedade do seu tempo. Fazendo uso do seu charme, rígido código de ética - nunca roubava o dinheiro dos clientes, apenas dos bancos - e talento em escapar-se das prisões, transportava consigo uma aura de herói, evocando a lenda de Robin Hood. Quem melhor do que Johnny Depp para transpor todos estes elementos para o ecrã? Provavelmente ninguém. É uma das melhores interpretações do ano, mas traída por uma história permanentemente indecisa sobre qual o melhor caminho a seguir: se apresentar Dillinger como herói ou evidenciar a sua faceta fria, cruel e violenta. A ideia seria uma junção harmoniosa de uma coisa e outra, mas na verdade ficou-se a meio caminho. Ou seja, não se chegou a lado nenhum.

E não chegar a lado nenhum é mesmo outro dos problemas de "Public Enemies". Como é hábito em Mann, os acontecimentos vão-se desenrolando lentamente, levando o seu tempo, como uma brisa suave que, de súbito, e quase sem os espectadores darem por isso, se torna forte rajada de vento. Mas aqui raramente saímos da leve brisa que não chega para levantar os ânimos. E não é por escassez de cenas de acção espantosamente realizadas que tal acontece. Se calhar até são demais - vários actores entram e saem de cena tão rápidamente que nem chegamos a perceber o que andavam ao certo por lá a fazer. O que falta é um maior apelo e profundidade dramática das personagens. E sem isso, nada feito.

De facto, no que se refere à excelência da realização, não há um pormenor esquecido que se possa apontar. Tudo, desde os movimentos de câmara à banda sonora (fantástico cameo de Diana Krall), passando pela fotografia e os detalhes de época, está meticulosamente trabalhado. Mas quando falha o aspecto humano, as qualidades técnicas ficam relegadas para segundo plano. Tanta precisão factual levou a que "Public Enemies" não tenha conseguido a necessária ligação aos dias de hoje. Falta-lhe um sentido maior, que atravesse o filme de forma transversal e lhe dê outra grandeza. Assim sendo, é apenas uma obra de óptimo entretenimento e uma pedagógica lição de história.

Apesar do que foi dito acima, vale a pena reservar duas horas para ver este filme, mais não seja porque a Michael Mann perdoa-se tudo – ninguém nos tira a certeza de termos sempre "Heat" para nos relembrar o que é cinema de topo.


Classificação: 6/10

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Cinemas - Estreia da Semana

Up - Altamente



Primeiro filme de animação com honras de abertura no festival de Cannes, "Up - Altamente" promete momentos de pura diversão para miúdos e graúdos. A história da improvável amizade entre um velho rabugento, que decide atar balões à sua casa e voar até à América do Sul, e uma criança que viaja clandestinamente no alpendre, irá decerto fazer vacilar o coração do mais forte dos espectadores.

A produção está a cargo dos estúdios da Pixar que, como os seus trabalhos anteriores nos demonstraram, não gostam nada de brincar em serviço. E são já demasiados os motivos para não deixar passar esta oportunidade de dispensar duas horas na agenda para assistir a cinema de primeira água. Seja em 3d, na versão portuguesa ou na versão original, vão por mim, "Up - Altamente" é simplesmente imperdível.

sábado, 8 de agosto de 2009

A Vida Em Palavras

Sobre a Diferença




KENNY: I want to be normal.

HOUSE: Take your steroids. And you get to live. And you can do your surgery. But it'll only change your face. It won't change who your face made you.

House M.D. - 4.07 Ugly

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Contrato



Título Original: Contrato
Realização: Nicolau Breyner
Ano: 2009

Nicolau Breyner é presença assídua em quase tudo o que é filme nacional. Já todos nos habituamos a que assim seja, e nem nos importamos muito com isso, até porque se trata de um actor respeitável e com talento - qualidades que grande parte dos que por aí andam não se podem gabar de possuir. Só que desta vez, farto de estar à frente das câmaras a levar com as indicações dos outros, Nicolau decidiu inverter os papéis: meteu mãos à obra e tentou a sua sorte na realização. Visto desta forma, parece uma boa ideia. Afinal, depois de uma carreira recheada como actor, ninguém melhor do que ele conhece o meio em que está envolvido, os seus truques e perigos. Alguma coisa deve ter aprendido sobre como realizar um filme, certo? Errado. O resultado é um filme paupérrimo e risível, sem ponta de sentido ou interesse. Felizmente para os envolvidos, a fantochada ainda não paga imposto.

Já diz o povo que quando não se sabe fazer uma coisa, o melhor mesmo é estar quieto. Nicolau não é da mesma opinião, e quem sofre com isso é o público. "Contrato" é um filme de acção, um thriller baseado no romance "Requiem para Dom Quixote", de Dinis Machado. Feito com um baixo orçamento, "Contrato" poderia eventualmente ter alguma graça, não fosse o caso de se levar tão a sério que caí imediatamente no ridículo aos 5 minutos de filme. Peter McShade (Pedro Lima) é um assassino profissional que, após ter sido mal-sucedido no seu último trabalho, é contratado para matar Georgios Thanatos (Nicolau Breyner, ele mesmo), um importante chefe da máfia. Só que Peter não tem o trabalho tão facilitado quanto parece à primeira vista. Agredido por três homens, vai parar ao hospital, onde conhece Júlia (Cláudia Vieira), a enfermeira que trata de si - e muito bem, por sinal - durante esse período.

E quando tudo o resto falha, a receita é a do costume: mamas a saltar pelo ecrã fora, que sempre dá para animar a malta. Disfarça alguma coisa, é verdade, mas um par de mamas, por muito bom que seja, não justifica hora e meia de filme e muito menos o preço do bilhete. Cláudia Vieira aproveita qualquer desculpa para pôr cá para fora os seus atributos, em situações que tanto são embaraçosas ou ridículas, de tão más e forçadas que saem. O porquê de esta ter aceite protagonizar algumas dessas cenas é um mistério difícil de explicar, ainda mais quando o seu corpo é usado de forma tão evidente e descarada, sem o mínimo de necessidade para o desenrolar da história. Sempre deu para promover o filme e enganar alguns incautos, que de certo não irão esquecer tão cedo a lição.

O principal problema de "Contrato" está no argumento. A história não faz sentido, não chega para encher hora e meia e arrasta-se penosamente até um final totalmente falhado, em que tudo se explica em poucos minutos de forma atabalhoada. Tudo o resto poderia ser desculpado, não fosse o facto da narrativa apresentar falhas de consistência enormes. Não existe uma personagem bem construído, ritmo e construção da tensão nem vê-los e os diálogos são mais falsos que as minhas t-shirts da feira.

Do elenco, safam-se Vítor Norte e Nicolau Breyner. Cláudia Vieira e Sofia Aparício - que aparece por lá ninguém sabe bem a fazer o quê - estão claramente na profissão errada. Pedro Lima está assim-assim, mas com uma personagem tão pobre como a que lhe foi dada, não seria justo pedir-lhe para fazer melhor. Quanto ao trabalho de câmara, frio e distante, sem qualquer rasgo de originalidade, serve para um novela, mas é insuficiente para um filme. E depois temos o product placement, que de tão óbvio torna ainda mais ridículo todo o filme. "Contrato" é patrocinado pela Skoda, logo todas as personagens, bons e maus da fita, conduzem Skodas para todo o lado. E pelo meio, ainda há um diálogo a gabar as capacidades dos carros da marca.

Enfim, é tudo mau demais. Nicolau Breyner esqueceu-se que não está em Hollywood, e como tal que não tem nem o dinheiro nem a experiência que existe nos EUA para a realização de filmes de acção sérios e credíveis. Vendo o resultado final, outro tipo de abordagem, mais descontraída e atrevida, seria de todo o interesse. Se já vimos piores? Claro que sim. No entanto, já não faz sentido apostar em projectos de qualidade duvidosa, mortos à nascença. É brincar com o público e com o cinema português, que merecem obras de qualidade e não mamas a abanar para chamar gente aos cinemas. Deste cinema "mainstream" de trazer por casa, que merecia nem ver a luz do dia, já nós estamos mais que fartos. Se virem este filme em algum lado, façam um favor a vocês próprios: fujam.

Classificação: 1/10

segunda-feira, 6 de abril de 2009

A Valsa com Bashir



Título Original: Vals Im Bashir
Realização: Ari Folman
Ano: 2008

É improvável, mas vem de Israel um dos mais surpreendentes e perturbadores filmes dos últimos anos. "A Valsa com Bashir" é um documentário de animação que procura reconstruir as memórias que Ari Folman - ao mesmo tempo realizador e personagem principal - guarda do seu envolvimento na invasão de Israel ao Líbano, em 1982. O resultado é uma mistura extasiante entre o sonho e a realidade, em que nunca conseguimos encontrar uma distinção clara entre o que realmente aconteceu e o que as recordações dos intervenientes fabricaram, vinte anos passados sobre o conflito. Mas apesar de todo o aspecto onírico e surrealista que atravessa o filme, são as passagens introspectivas, em que as personagens olham para trás e se apercebem da verdadeira dimensão das suas experiências na frente de combate, que dão a esta obra o rótulo de imperdível.

O filme abre com uma assustadora sequência na qual um grupo de cães, violentos e raivosos, atravessa as ruas da cidade de Telavive, derrubando tudo o que lhes aparece no caminho. O que vemos é a representação de um pesadelo que tem vindo a atormentar um amigo de Ari Folman nos últimos dois anos e meio, e que tem origem no tempo de serviço que prestou no exército israelita - onde foi obrigado a matar exactamente vinte e seis cães. Atormentado, procura que Folman lhe dê algum tipo de conselho sobre como ultrapassar o trauma. É nesse momento que Folman se apercebe que, com excepção de uma imagem fugaz, é incapaz de relembrar-se do período em que esteve no Líbano. A mente bloqueou essas memórias.

Esse facto deixa-o inquieto e com a sensação de que necessita de perceber a verdade sobre o que realmente aconteceu, especialmente no que se refere ao massacre de Beirute. É a partir daí que procura os antigos amigos que com ele estiveram no Líbano, para lhe poderem ajudar a devolver as recordações. Desse modo vai completando o puzzle na sua mente, ao mesmo tempo que permite aos espectadores visualizar a narração que estes lhe dão dos acontecimentos - alguns caricatos, a maior parte dramática e trágica. O uso da animação permite a liberdade de nos misturarmos no universo estilizado das personagens, de outra forma missão quase impossível, imprimindo uma energia visual invulgar. É a prova de que a animação não se esgota na fórmula dos filmes da Disney, e que pode e deve ser usado com a mestria com que outros usam câmaras e actores.

Acima de tudo, "A Valsa com Bashir" preocupa-se em mostrar como é que os soldados, na altura com meros 20 anos e agora homens de meia-idade, sentiram os acontecimentos, e também como é que o tempo que entretanto passou moldou a sua visão sobre eles. Todos eles têm contas a ajustar com o passado, feridas ainda bem abertas, imagens e pecados que provavelmente os vão acompanhar até ao fim da vida. Os motivos da entrada de Israel no Líbano, divisões ideológicas ou as opiniões sobre de que lado se encontrava a razão não são aqui abordados, nem interessam.
Os sentimentos mais comuns no filme são o de nostalgia e tristeza, bem evidentes, aliás, na forma como são evocados os acontecimentos passados. O próprio horror de toda a situação chega-nos de uma forma desencantada, a um ritmo lento, mas com grande impacto psicológico. À medida que o filme se vai aproximando do fim, a tensão sobe e atinge-nos de forma cada vez mais certeira, até chegarmos a uma sequência final simplesmente arrepiante, onde a animação dá lugar a imagens reais das consequências do massacre de Beirute. Essa mudança súbita faz-nos aperceber da verdadeira dimensão humana do massacre, atira-nos o insustentável peso da realidade para os ombros. E deixa-nos sem reacção, a precisar de alguns segundos a olhar para a tela vazia, já depois de o filme ter terminado, para nos recompormos.

"A Valsa com Bashir" quase não tem defeitos. Embora tenha passado mais ou menos despercebido pelo nosso país e tenha visto fugir o Óscar de melhor filme estrangeiro, trata-se de uma obra marcante e incontornável, um registo que ficará gravado na retina de quem o viu. A inovadora utilização da animação, aliada à narrativa clássica dos documentários, revelou-se uma aposta mais que ganha. Tal como Ari Folman constatou por si próprio, a visão que tem sobre a existência não mais voltou a ser a mesma depois de pisar território onde reina a devastação e a morte. Também para nós, espectadores, é uma viagem inesquecível aos infernos. Não percam a oportunidade de ver esta pérola.

Classificação: 10/10