sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Arte de Roubar




Título Original: Arte de Roubar
Realização: Leonel Vieira
Ano: 2008

Não é novidade para ninguém se disser que Leonel Vieira está longe, mas muito longe mesmo, de ser um realizador dotado de um grande talento. Com obras como "A Bomba" ou "Mustang" no currículo, é natural que deixe qualquer um com os pêlos em pé só de ouvir falar na estreia de um novo filme seu. Por essa mesma razão, e como pessoa avisada que sou, foi com expectativas baixas que entrei no cinema para ver "Arte de Roubar".

E fico feliz por poder afirmar que, afinal, não é tão mau quanto inicialmente pensei. Não é um filme inovador, não vai trazer novos caminhos para o cinema em Portugal e nem tão pouco me parece ter qualidade para, como parece pretender Leonel Vieira ao escolher realizar o filme em língua inglesa, triunfar no estrangeiro. Mas, no fim de contas, trata-se de um bom entretenimento, sem intenções de ser mais do que isso. Um guilty pleasure que se assume com gosto.

Chico Silva(Ivo Canelas) e Jesus Fuentes (Enrique Arce) são dois ladrões sem sorte e desajeitados que vêem todos os seus planos "perfeitos" saírem furados, por uma razão ou outra. Desmotivados e sem rumo certo, o destino acaba por entregar-lhes de bandeja o golpe perfeito: roubar um quadro de Van Gogh, no valor de cinco milhões de euros, da mansão de uma velha condessa. Isto com a preciosa colaboração do mordomo da condessa (Nicolau Breyner), irritado por ter sido esquecido na recente herança esta elaborou. Mas nem tudo é tão simples como parece, e os dois acabam envolvidos acidentalmente num esquema maior.
Leonel Vieira confessou ser um fã devoto de Tarantino e dos irmãos Coen, e não escondeu a influência destes na sua obra. Mas nem precisava de o fazer, já que é bem visível para os espectadores familiarizados com a filmografia destes realizadores, ou até de Robert Rodriguez e Guy Ritchie, de onde surgiu a ideia para "Arte de Roubar". O espírito nonsense, a comédia negra, os diálogos rápidos e atrevidos, munições disparadas como se não houvesse amanhã, confusões e desentendimentos. Está lá tudo.

O modelo, verdade seja dita, está gasto, roto e tem buracos. E muitos foram os que anteriormente, e com bem melhores resultados, o interpretaram. Chamem-lhe homage, tributo, pastiche ou o que quiserem. Para mim não passa de uma aberrante falta de ideias inovadoras, que culminam numa cópia despropositada e vazia de métodos que até já cheiram a mofo. O guião, escrito por João Quadros com a colaboração de Roberto Santiago, é mesmo o elo mais fraco pelo qual acaba por ir cedendo o restante. Falta-lhe graça, tem falas medíocres, pouca energia e está cheio de momentos de disparate que roçam o embaraçoso. De que me lembre, só uma coisa tem em doses generosas: clichés. Se for apreciador...

Mas "Arte de Roubar" também tem os seus pontos fortes. A começar pelas interpretações, com Ivo Canelas e Henrique Arce a conseguirem, com pouca matéria-prima, construir personagens com substância e estilos próprios. Flora Martinez e Soraia Chaves, nem que aparecessem só para encher o olho com tanta beleza, já faziam muito. Mas são ainda duas actrizes de talento, e Soraia Chaves, embora num papel mais discreto - e com mais guarda-roupa - do que o habitual, fica extremamente bem na fotografia. O resto é ver o desfilar de personalidades bem conhecidas do nosso pequeno "ShowBiz" em papéis secundários, como Aldo Lima e Pedro tochas.

A realização de Leonel Vieira é de boa qualidade, filmando um Portugal de vastas planícies, praças de touros e empregadas de mesa desgrenhadas. Tudo em tonalidades de amarelo, que mais fazem lembrar uma tarde de verão tórrida no México. Consegue imprimir ritmo à história e ela flúi naturalmente. Para mais, não existe nenhum daqueles erros de fotografia e sonoplastia de palmatória, que tantas contribuem para transmitir uma imagem de falta de meios e de falsidade ao nosso cinema. Os planos são bem estudados, os locais bem escolhidos e não fosse um ou outro momento em que as cenas de acção poderiam ser mais arrojadas, estaria quase perfeito.

A banda sonora, da autoria de Paulo Furtado (Legendary Tigerman), foi uma óptima escolha. Quanto à questão do filme ser falado em inglês, que está a levantar algumas dúvidas e a suscitar críticas, não penso que seja relevante. Com certeza que, falado em português, teria outro sabor. Mas temos de fazer um esforço para compreender que o nosso mercado é pequeno e as aspirações de Leonel Vieira e companhia são legítimas. Num filme tipicamente comercial, que é mais um entre milhares, pode ser esse facto que lhe dê o lucro extra que as nossas produtoras bem precisam. Esperemos para ver. No geral, podemos considerar que "Arte de Roubar" é um filme mau, mas se for visto despreocupadamente e sem preconceitos, pode ser divertido. Vão ver que andam por aí coisas bem piores.


Classificação: 3/10

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